sexta-feira, 20 de julho de 2018

Calimera


Acho que este meu espaço poderia chamar-se "O Blog da Calimera"... Gostei! Calimera…foi o que alguém me chamou estes dias. Fiquei curiosa, serei? Fui ver o seu significado, e parece que costuma manifestar-se em jeito de birrinhas, egoísmos, queixinhas, choros sem lágrimas, chantagens e amuos. Penso que (já) não faço nada disso. E se por acaso o fiz num passado remoto, não me recordo. Amadureci muito, até me sinto quase a cair de podre, então! 
Posso, no máximo, viver reclamando de muita coisa que me faz revirar os olhos, de perder a paciência com gente básica, que não se toca…enfim…
É que cuscando pelo FocinhoBook vai se mirando o espelho da realidade: cada vez mais “calimeros e calimeras” há por aí; pessoas que anunciam vezes sem conta a sua retirada, mas nunca saem de cena; que insinuam aos quatro ventos ser mal-amadas, incompreendidas e injustiçadas, procurando a aceitação pela chantagem, quando têm tanta coisa na vida que as poderia fazer felizes; pessoas insatisfeitas com o tanto que têm, transformando ninharias em tragédias. 
Esta síndrome do “Calimero” sempre existiu, não é culpa da crise, e tende a crescer exponencialmente, e pode até tornar-se moda! Talvez salte mais à vista atualmente e entra-nos pelos olhos adentro, perturbando-nos o espírito, pois temos que aprender a conviver com quem sofre dela, a lidar com o drama, o horror e outros teatros que tais.
Todos nós poderemos ser atacados por ela em determinados períodos da vida, mas, tal como as doenças normais de infância, acabam por desvanecer-se. Noutros casos, demora um pouco mais. Serão as depressões as responsáveis? Talvez sim, nas pessoas que vivem verdadeiros problemas, pelas agruras da vida; não pelas ninharias que insistimos em transformar em tragédias. Há pessoas a quem dá jeito uma depressãozinha, outras há que vivem deprimidas uma vida inteira, que chique fazer uma birra, que máximo dar um show! E costuma-se dizer “tem uma personalidade tão forte!” e ainda há quem acredite, que é tudo força do caráter.
Esta síndrome, que infelizmente não aparece nos anais da psicologia, requer como tratamento uma boa dose de estalos e portas no nariz de forma a despertar para a dura realidade: há sempre alguma m*rda que acontece nas nossas vidas. Convém é não dar importância a essas m*rdas e seguir a vida sem dizer "isto só me acontece a mim", caso contrário as pessoas que sofrem desta síndrome acabam redundantes e a saturar quem até tem paciência para ouvir os lamentos característicos.
Não me considero uma calimera, apesar de achar o Calimero uma figura adorável. Confesso que sou avessa a essa mania da autocomiseração e da paranoia do "não há nada que não me aconteça"... e aquelas pessoas que quando o dia corre lindamente e de repente dizem "Mmm estou tão contente e a vida corre-me esplendidamente… algo de ruim vai acontecer em breve, com certeza!" – uma variante da síndrome de Calimero, sem dúvida!

O Segredo da Boa Disposição
"Deixaram-nos aqui. É mesmo assim. É a vida. Tem graça, não tem? A vida tem graça. Nós temos graça. É engraçado estarmos todos aqui. A incerteza geral da existência, aliada à certeza particular do facto de termos nascido e de irmos um dia esticar o pernil, é de morrer a rir. Entre outras coisas. Já que nos puseram aqui, indispostos, mal distribuídos, condenados à confusão e à companhia dos outros, o mínimo que podemos fazer é pormo-nos o mais bem-dispostos que pudermos.
O segredo da minha boa disposição é pensar o mais possível nos outros – nos outros que amo e que me têm de aturar, nos outros de quem só conheço o sofrimento e me fazem sentir a sorte que tenho em sofrer tão poucochinho – e o menos possível em mim. Quanto mais eu me desprezo e desconheço, quanto mais eu entristeço de me entender, mais preciso que haja quem goste de mim. Ou pelo menos da minha companhia. Sempre bem-disposta, claro!"

Miguel Esteves Cardoso, in 'Último Volume' 

2 comentários:



  1. Como é habitual, gostei!
    Gostei do autorretrato feito com humildade é certa vaidade das vitórias que já alcançaste com o amadurecimento próprio da vida vivida.

    A grande particularidade do Calimero ou pequena particularidade que passa despercebida é ele ter parte da casca do ovo na “mona” o que sinaliza a criança que não se descola... é a ingenuidade que acompanha a vida, levando a reclamar e a ver o mundo carregado de injustiça...

    O Calimero também se revolta...

    Lembro-me do hino de muitos bares e muitas festas, a canção do Calimero e a Abelha Maia do cantor mais “tonto” que ironiza todos os outros e brinca com as letras... não aprecio mas sei que existe, o Jaimão!

    O Calimero é enervante, queixa-se da vida e de tudo que a vida tem... mas seria falso se disséssemos que numa fase das nossas vidas nunca tivemos essa parte enervante ... outros ficaram com ela para a vida!

    O engraçado é que ao Calimero ou com ele, apareceu a abelha, uma curiosa, uma aventureira e despreocupada, até de certa forma um pouco volúvel que cria agitação na colmeia por ser inteligente e sagaz.

    A abelha passa a ser muito mais livre e deixa de estar pressionada às regras, por isso há um “faço o que quero e o que me dá na real gana”

    Creio que estás a deixar morrer o Calimero para soltar a abelha que existe em ti e assim começares a dar “picadas” onde a tua liberdade te exigir.

    Fico à espera de um novo texto! Solta a abelha que existe em ti porque há sempre alguém que gosta de abelhas.
    Bjs

    https://youtu.be/d8RYUZT57XA

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  2. Andas a espicaçar a minha imaginação. Gostei muito também!sinto-me picada...bj

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