terça-feira, 14 de abril de 2015

As férias do papagaio na praia

Ficou o silêncio no apartamento e no prédio. A dona dele apareceu. Fez-lhes companhia durante quase 1 mês. Palrava e ladrava o tempo todo, grasnava como as gaivotas, imitava as gargalhadas, e era um barulhão, dava beijinhos gostosos depois de dizer “cucu”, cantava “who let the dogs out” além de dizer “olá man” ou apenas “olá” quando elas chegavam a casa… era da espécie “amazonia aestiva” (o papagaio verdadeiro) e tornou-se a companhia delas todos os dias desde as 8h da manhã, ou quando o “cocó” (dizia ele, seria de Jacó?) visse a luz do dia nascer.

Eram duas amigas de aproximadamente 15 anos, conheceram-se um dia de forma insólita, numas férias de verão no Algarve, conviveram algum tempo, depois houve um longo afastamento (seguindo ambas vidas diferentes, com os respetivos companheiros) e, novamente de forma inédita, a que ficou viúva procurou a outra que até já tinha mudado de número de telemóvel, mas conseguiu encontrá-la! São estes os mistérios da amizade, a gente encontra algumas pessoas por acaso, umas ficam por alguns momentos, outras ficam para toda a vida.

Lá estavam elas de novo no Algarve, desta vez decidiram partilhar um apartamento durante um período de 3 meses. A que ficou viúva já não precisa de trabalhar mais, é só curtir agora (se quiser), mas a outra ainda procura um trabalho, preocupada com o futuro.

Certa manhã, ao acordar, uma delas vai à varanda do 6º andar, olha para baixo e vê um papagaio na varanda do 4º andar… acha-o lindo e chama por ele, sem imaginar que ele ia subir mesmo; calculou a distância entre as varandas de um lado e doutro do edifício, e ei-lo no parapeito da varanda pronto para tomar café e pão torrado junto com elas. Entrou para dentro do quarto e ficou empoleirado no cimo da porta, nem tentou fugir mais. Para quê? Tinha encontrado um lar, com duas boas amigas, e sentiu-se bem acompanhado.

Foi preciso comprar comida própria para ele, era um comilão e petiscava praticamente tudo, desde legumes a fruta ou frutos secos. Em cima do frigorífico, quando uma ou outra estava a cozinhar, o “cocó” queria sempre vir quase para cima do ombro para provar a comida, se a corrente fosse mais comprida e o permitisse.

Foram contactadas as entidades responsáveis - o ICNF, CITES, GNR/SEPNA - para poder encontrar o seu possível dono, tinha anilha mas não tinha chip. Parecia um mistério, um papagaio aparecer assim numa varanda de apartotel em frente ao mar... seria alguma alma penada? Chegaram a pensar… Havia muita vontade de ficar com aquele bichinho simpático, mas uma delas decidiu que tinha que ficar tudo legalizado, e ficaria em nome dela, se fosse o caso.

Entretanto a PSP envia um email a pedir para entregar o papagaio, tinha aparecido a dona; e lá veio ela buscá-lo no dia seguinte, até chorou emocionada ao revê-lo. Na hora de entrar para a gaiola a ave ainda ficou com a pata agarrada à “dona” amiga que o alimentou e acarinhou durante quase 30 dias, via-se que ia sentir saudade.

Afinal já andava perdido há 2 anos e a verdadeira dona pensava nunca mais voltar a vê-lo: outro facto incrível, como é possível, onde terá andado todo esse tempo, em casa de outra família e entretanto fugiu, ou abandonaram-no? (no dia em que chegou, tinha aspeto de bem tratado e notava-se que era amestrado).

E ficou o mistério… a dúvida: terá a linda ave exótica vindo passar um mês de férias à beira-mar e conviver com 2 amigas com tempo para apajeá-lo? Podia ser…

Ficou a saudade, da companhia e do barulho que tanto fazia, sem se preocuparem com o que pensariam os poucos turistas que estavam no prédio praticamente desabitado, pois o tempo bom tarda a chegar. Até na Páscoa choveu, quando aquele lugar costumava ser o destino de muita gente em férias à procura de sol.


1 comentário:

  1. Deixei-me levar na rica descrição da tua escrita e nas emoções com sabor agridoçe e sobe muito bem! Abraço.

    ResponderEliminar