Um conto que gostei de ler, era em outro idioma, mas pedi autorização ao seu autor para traduzi-lo e publicar aqui no meu blogue:
Deviam ser 5 da
madrugada quando o jovem chegou à estação e sentou-se num daqueles bancos
velhos de madeira duplos (costas com costas), à espera do comboio. Estava sozinho naquele lugar, a pequena tabacaria e a cafetaria da
estação ainda não tinham aberto e ele morria de vontade de fumar. O seu corpo
pedia desesperadamente mais nicotina do que um café ou o pequeno-almoço. Tinha
tabaco, mas esqueceu-se do isqueiro quando saiu de casa ainda meio a dormir, e agora
não havia ali ninguém a quem pedir lume.
Para distrair-se,
decidiu ler um pouco, uma vez que ainda faltava uma meia hora para o comboio chegar.
Pegou naquele livro que encontrou em casa da mãe a quem chamava “a eterna
viúva”, pois era filho de pai ausente e ela tinha-o criado sozinha, até que um dia a
morte a levou. Era um livro inédito e com uma dedicatória ambígua, e mais
estranho ainda era ter sido da sua mãe, uma mulher humilde e pouco culta. O autor era Darío Espina, um antigo prémio
Nobel com uma escrita algo complicada e leitura ainda mais difícil, sendo famoso há algumas décadas e considerado um escritor para intelectuais.
O livro cativava-o da
primeira à última página, já o tinha lido várias vezes, tendo verdadeiro fascínio
pela aura de maldição e mistério que envolvia esse escritor, por
quem daria tudo para conhecer pessoalmente.
Sentiu que alguém se
sentava atrás dele quando ouviu o ranger da madeira velha do banco. Levantou os
olhos do livro e, olhando pelo grande espelho ao fundo da sala de espera,
reparou que era um indivíduo já maduro e obeso vestindo um fato cinzento tão
desalinhado quanto antiquado que, com ar cansado e ausente, olhava em volta.
Nesse instante, teve vontade de pedir-lhe fogo, mas…quando se virou para o
desconhecido, pôde sentir o seu hálito a álcool, e isso fê-lo desistir. Seria algum
bêbado em fim de noite? E depois, com o pretexto de dar-lhe lume, iria
perturbá-lo com conversa de chacha? Com estas dúvidas, conseguiu reprimir a
vontade de fumar e voltou à sua leitura.
Darío havia saído com
o intuito de procurar inspiração e poder terminar, de uma vez por todas, o
livro que andava a escrever. Já há meses que tentava terminá-lo, contudo, a
obsessão que ia aumentando nos últimos tempos prejudicava a sua mente e frustrava
qualquer esforço criativo.
Como o despertar de
uma larva que havia estado adormecida dentro do seu casulo, os pensamentos
sobre o filho que tivera com aquela mulher e o remorso de tê-los abandonado
haviam aflorado com tanta força que bloqueavam a sua mente de forma contínua
“onde estará ele?” “a sua mãe ainda estará viva?” “saberá algo sobre mim?”…
Após ter deambulado
sem sentido pela noite, e sem que a bebida tivesse mitigado a sua dor, Darío
Espina sentou-se ali, derrotado, na tentativa inútil de evitar mais uma noite
sem dormir e com pesadelos. Talvez fumar o tranquilizasse… mas… não tinha
tabaco, e estava tudo fechado! Ainda pensou em pedir um cigarro àquele jovem
sentado atrás de si, que podia ver através do espelho e que, curiosamente,
estava a ler um livro seu, reconhecendo-o pela capa.
Porém, não
o fez. Darío era um homem bastante tímido e, além disso, achava que era um
pecado enorme estar a interromper alguém que lê um livro.
Os minutos
iam passando… A falta de nicotina criava em ambos uma inquietude que minimizava
as suas apreensões… a necessidade pode derrubar muros… e por fim, como se
tivessem combinado, ambos se voltaram e encararam-se para pedirem o que lhes
faltava…
Talvez
pudessem falar um com o outro!... Talvez pudessem travar conhecimento!...mas já
era tarde! Nesse mesmo instante chegou o comboio, que parou, as portas abriram-se ruidosamente diante daquele banco onde os dois se sentavam e o jovem, fechando o livro,
apressou-se a subir antes que o perdesse…
Sim… algo
esteve quase para acontecer…Sim, foi um “quase”…talvez uma única palavra
pudesse mudar os seus destinos…porém, não aconteceu… e aqueles homens seguiram
o seu rumo, na ignorância, sem nunca mais voltar a encontrar-se.
E é assim…
talvez… na melhor das hipóteses… quem sabe… as barreiras que colocamos diante
dos outros e a porcaria do “nosso espaço”… longe de proteger-nos, só faz com
que nos afastemos do que mais desejamos.
Fez-me lembrar que sou assim também, quantas vezes podia falar e não falo, perdendo alguma boa oportunidade. Pertenço a uma família pouco comunicativa, e quem sai aos seus "não é de genebra"...
A boa comunicação faz muita falta para que as pessoas se entendam e quiçá vivam mais felizes,
sentindo-se mais acompanhadas.
Como conseguimos viver às vezes tão isolados e fechados em nós mesmos, se o homem é basicamente um ser de natureza sociável, cujo sucesso pessoal depende de viver em grupo ou em sociedade? Será indiferença, ou temor? Será que nos tornámos numa espécie individual e egoísta? Será que já não necessitamos de estar juntos para nos defendermos? Será talvez o medo de que alguém venha desassossegar ainda mais a nossa vida já tão em desassossego, ou que levante a muralha emocional que de forma pedante chamamos de “nosso espaço”?
Aristóteles escreve
algures, que “O homem é um ser social. O ser capaz de viver isoladamente ou é
um deus ou é um bicho, mas não um ser humano”. Serei um deus…? Porque um bicho
não quero ser! (sim, confesso que já fui bicho-do-mato, mas mudei muito, para meu próprio bem).
Gostei mais do que escreveste de ti do que da tradução... esta exige, exigiu uma ginástica mental para integrar os dois personagens que por preguiça preferi, tão só, observar o cenário proposto onde os dois se sentaram mudos e calados partiram os destinos.
ResponderEliminarTu, foste mais explícita e mais "tu"!
Gostei por isso, por seres tu mesma.
Fica bem e beijos, Gringa do Sol que se esconde!
Obrigada Rafa! beijo de sol :)
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